IFUSP sediará o desenvolvimento de dois novos projetos em Tecnologias Quânticas

IFUSP sediará o desenvolvimento de dois novos projetos em Tecnologias Quânticas

Professor Rafael Barros e Dr. Rodrigo Benevides tiveram projetos contemplados na chamada para Jovens Pesquisadores do Programa FAPESP QuTIa. De acordo com Paulo Nussenzveig, o resultado do primeiro edital do programa reafirma o IFUSP como centro atrativo de talentos.

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Dos cinco projetos selecionados pela chamada “FAPESP Young Investigator Grant on Quantum Technologies”, dois serão desenvolvidos no IFUSP, coordenados pelos pesquisadores Rafael Barros e Rodrigo Benevides. Um terceiro projeto, a ser executado na UFABC, será liderado pelo pesquisador Hans Marin, formado no grupo do Laboratório de Manipulação Coerente de Átomos e Luz (LMCAL) do IFUSP, onde também realiza pós-doutoramento. Para o Prof. Paulo Nussenzveig - um dos articuladores iniciais do que se tornou a primeira iniciativa quântica brasileira - o resultado da chamada é um “bom auspício” para o IF, e indício da atratividade do Instituto como local privilegiado para se desenvolver ciência e tecnologia quânticas no país. 

De acordo com o pesquisador, o Brasil goza de prestígio e reconhecimento internacional nas ciências quânticas, mas a geração de tecnologias associadas ainda fica “a desejar”. Em 2020, já havia uma pressão internacional em relação a uma iniciativa quântica no Brasil, já que outros países de menor potência na área estavam se organizando nessa direção. Nesse contexto, Nussenzveig formou e participou de um pequeno grupo, composto principalmente de docentes de universidades paulistas, que começou a discutir a implementação de uma iniciativa quântica no país a partir de São Paulo. Essa “atividade de pandemia” viabilizou o engajamento de pessoas e o planejamento do projeto.

Em 2023, após dificuldades durante a pandemia, a FAPESP sinaliza que a iniciativa vai se concretizar. O grupo envolvido nas discussões iniciais lidera, então, o workshop “Quantum Technologies”, a fim de produzir, em três semanas intensivas de trabalho, um compreensivo roteiro de implementação do programa.

Assim, o lançamento do Programa FAPESP QuTIa (Quantum Technologies InitiAtive), na próxima quarta-feira, 11/12, inicia nova fase do programa e marca a maturidade de uma rede de colaboração nacional: uma comunidade informada e ativa, com massa crítica acumulada de vinte e cinco anos de experiências e interação. 

Mirando o futuro da iniciativa, Nussenzveig enfatiza a necessidade da participação de pessoas jovens. Por isso, revela uma satisfação especial que o primeiro edital do programa seja um “Auxílio à Pesquisa Jovem Pesquisador” voltado à área. A chamada, lançada em abril deste ano, selecionou duas propostas que serão desenvolvidas no Instituto de Física da USP. O projetos estão vinculados ao Departamento de Física Experimental e se darão em intensa colaboração com o LMCAL, considerado um dos pilares da rede de colaboração nacional à frente da iniciativa quântica no país. Ao BIFUSP, os pesquisadores contemplados apresentam e contextualizam seus projetos, que já estão em andamento, em suas fases iniciais.


Projeto StruQT | Deploying Structured light for Quantum Technologies
Prof. Rafael Barros (Depto. de Física Experimental do IFUSP)

O StruQT será um projeto bem interessante. O objetivo principal da proposta é a abertura de uma nova rede quântica no estado de São Paulo, a Quantum Network of São Paulo (QneSP), e seu uso para troca de chaves criptográficas de maneira absolutamente segura. A importância do projeto está no avanço constante dos chamados computadores quânticos, frente aos quais os métodos atuais de criptografia são ineficazes. Esse contexto põe a privacidade dos sistemas de comunicação atuais em perigo iminente: tão logo quanto um computador quântico de larga escala seja construído, a privacidade das comunicações atuais estará comprometida. 

Uma resposta para esse problema é a distribuição quântica de chaves (QKD), que é o que nós faremos em SP. A QKD permite que chaves criptográficas sejam enviadas e recebidas de maneira completamente privada, graças aos princípios da mecânica quântica. Essencialmente, devido aos princípios da mecânica quântica, como o famoso princípio da não-clonagem e a monogamia de emaranhamento, qualquer tentativa de interceptação da troca de chaves pode ser percebida de maneira inequívoca. 

A comunicação quântica é uma tecnologia muito madura, e redes quânticas de diferentes escalas já estão em pleno funcionamento mundo afora. Até mesmo comunicação quântica via satélite (a missão Micius) já foi realizada, resultando em uma chamada de vídeo "quantum safe" entre Beijing,China e Vienna, Austria. No Brasil, redes quânticas estão começando a ser desenvolvidas pelos principais grupos de óptica quântica do país, graças a sérios investimentos em pesquisa e desenvolvimento nesta área. 

Com a proposta StruQT, nós pretendemos implementar uma das primeiras redes quânticas do país. Nosso trabalho será o desenvolvimento de fontes de fótons emaranhados, que são um recurso fundamental para a comunicação quântica, e de detectores adequados para QKD. Com isso, pretendemos formar um grupo especializado no hardware essencial requerido por iniciativas em comunicação quântica, integrando o movimento nacional em direção ao desenvolvimento da área. 

A rede quântica operada no contexto do projeto será QneSP - São Paulo quantum Network, que será implementada usando a infraestrutura de fibras ópticas USPnet, pertencente à Universidade de São Paulo. Dentro desta rede, nossa proposta é criar um canal de comunicação quântica segura entre os campi USP de Ribeirão Preto e Piracicaba, nos quais fótons emaranhados gerados no Campus USP São Carlos serão detectados. Esta é uma perspectiva muito excitante, visto que os campi USP de Ribeirão Preto e Piracicaba estão a mais de 150km!

Um passo adiante, no StruQT nós vamos explorar ferramentas de óptica moderna no contexto da QKD. Especificamente, nós investigaremos a codificação e medida de informação quântica nos diferentes graus de liberdade da luz, com ênfase na polarização e no tempo/frequência/cor. A ideia é implementar QKD com chaves criptográficas de alta dimensão, i.e., chaves constituídas de um alfabeto maior do que o 0 e 1 dos bits quânticos, os chamados qdits, que prometem vantagens para QKD tais como maior tolerância erros e possivelmente maiores taxas de tráfego de dados.

Nacionalmente, o projeto conta com uma interação sólida com a Rede Rio Quântica, liderada pelo Prof. Antonio Zelaquett Khoury, sem mencionar a integração com a comunidade de óptica e informação quântica de São Paulo. Em particular, o Laboratório de Manipulação Coerente de Átomos e Luz (LMCAL-USP), liderado pelos Profs. Marcelo Martinelli e Paulo Nussenzveig, será indispensável nesta jornada. Internacionalmente, o projeto conta com a colaboração com diferentes instituições, notavelmente com o grupo de óptica quântica experimental da Universidade de Tampere - Finlândia, para o desenvolvimento de detectores de fótons únicos usando óptica não-linear e luz estruturada. Tais colaborações serão essenciais para a superação dos desafios experimentais, que serão muitos.


Modular microwave-optical quantum transduction 
Dr. Rodrigo da Silva Benevides (Group of Hybrid Quantum Systems / Department of Physics - ETH Zürich)

A ideia geral do projeto é fazer o link entre uma tecnologia com muito potencial para computação quântica - os qubits supercondutores - com a tecnologia mais bem estabelecida de comunicação a longas distâncias - as fibras ópticas. Para isso, o projeto pretende desenvolver os chamados "transdutores quânticos", uma tecnologia ainda em estágio bem inicial de desenvolvimento mundo afora. Especificamente, nós queremos criar um dispositivo que opere tanto em frequências da ordem de GHz, usando os qubits supercondutores e onde a computação, em si, dos sistemas é realizada, com frequências da ordem de 200 THz, para operação em sistemas ópticos de telecomunicações. 

Sobre parcerias:

O projeto vai demandar conexões com distintos laboratórios de microfabricação no Brasil. Dentro da USP, a Escola Politécnica conta com equipamentos que vão ser utilizados para parte do desenvolvimento dos dispositivos. Fora da USP, pretendemos utilizar estruturas de microfabricação da UNICAMP e/ou do CBPF, onde partes específicas destes qubits podem ser fabricadas. Além disso, a médio prazo (com um laboratório já estabelecido no IFUSP), vamos fortalecer conexões internacionais com outros grupos trabalhando na mesma tarefa e com as quais eu já tenho colaborações ou nos quais eu trabalhei. Dois exemplos são a ETH Zürich, na Suíça, e a TU Delft, na Holanda, dois centros de destaque internacional na área de tecnologias quânticas. Em ambos os casos, tenho expectativa de criar oportunidades de intercâmbio para alunos envolvidos no projeto, a fim de fortalecer essa área no IFUSP.

Desafios envolvidos:

Um desafio significativo, mas que criará novas condições bastante interessantes ao Instituto é a aquisição e instalação de um refrigerador de diluição multiusuário, o primeiro da USP e possivelmente apenas o terceiro do tipo na América Latina. Este equipamento permite resfriar amostras a temperaturas incrivelmente baixas (da ordem de 10 mK). Com isso, os qubits supercondutores podem ser operados no no seu estado fundamental, permitindo a realização de operações computacionais nestes qubits. Além disso, por seu caráter multiusuário, há a expectativa que outros grupos do Instituto se beneficiem do equipamento, podendo fazer estudos de distintos materiais e interfaces em temperaturas ultra baixas.

Acredito que esse projeto vai ajudar a abrir no IFUSP uma linha de pesquisa bastante relevante internacionalmente. Hoje, os sistemas baseados em qubits supercondutores estão entre aqueles com o maior potencial de ser a base fundamental da computação quântica, tanto que diversas empresas de tecnologia (IBM, Google, Amazon, entre outras) estão investindo muitos recursos nessa direção. Creio que esse projeto pode ajudar a formar no IFUSP pesquisadores capazes de participar do desenvolvimento dessa rica área.

Agradecimentos:
À FAPESP, pelo auxílio concedido. Além disso, agradeço particularmente ao professor Marcelo Martinelli da FEP e à diretoria (Profª. Kaline Coutinho e Prof. Cristiano de Oliveira) pelo suporte institucional fornecido para a aprovação do projeto. 

Fotos: Rodrigo Benevides / Acervo pessoal

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