Artigo | Structural investigation of antisite-disordered FeGa3 under high-pressure

Dos autores Aryella F. Rabello, Cauê K. Ribeiro, Valentina Martelli; Nenad Velisavljevic, Dmitry Popov, Yuming Xiao, Giovanni Hearne e J. Larrea Jiménez
Publicado em AIP Conference Proceedings.
Texto do autor Julio Larrea.
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Trabalho dos doutorandos Aryella Faé Rabello e Cauê Kaufmann Ribeiro, sob orientação do Prof. Julio Larrea Jiménez (LQMEC – IFUSP), foi recentemente publicado na revista AIP Conference Proceedings. O trabalho é resultado de uma colaboração internacional com pesquisadores do Argonne National Laboratory (ANL, Estados Unidos) e da Universidade de Johannesburg (UJ, Sul África). Usando a técnica de difração de raio-X (raios-X) em pressões muito altas (até 40 GPa) no Sincrotron ANL e com um estudo refinado dos dados experimentais através de métodos de análises de dados no estado da arte, se encontrou parâmetros microestruturais e simetrias locais dos arranjos atômicos em presença de desordem atômica chamada de antístio. Nossos resultados são promissores para estabelecer uma nova rota de induzir novos estados quânticos correlacionados a partir da seleção de um tipo de desordem atômico, fato atípico em materiais quânticos funcionais.

A procura por materiais que apresentem estados quânticos correlacionados é de extrema relevância para elaborar plataformas que permitam compreender a física quântica de muitos corpos e os limites da termodinâmica, i.e., as transições de fase quântica que emergem na temperatura do zero absoluto. 

Um dos critérios esperados teoricamente para a realização de um material que hospede estados quânticos correlacionados é que este apresente uma estrutura cristalina livre de desordem atômica ou também conhecido como “pristino”. Esta condição não pode ser satisfeita em um material real, já que a desordem atômica é inerente à matéria. Para certas simetrias de arranjo de átomos, e atendendo a sua configuração eletrônica, alguns métodos de sínteses de materiais inovativos têm sido elaborados em poucos laboratórios no mundo, causando uma escassez de ligas de materiais considerados próximos a serem prístinos. A pesquisa nestes materiais se torna ainda mais exclusivo quando o estudo dos estados quânticos coletivos é feito a partir da modificação das interações fortes entre carga, spin e orbital dos elétrons usando condições extremas de altas pressões e intensos campos magnéticos (evitando a modificação do ambiente prístino). Dentro deste cenário, a atual comunidade da física da matéria condensada enfrenta um desafio, onde a escassez de evidências experimentais de tais estados quânticos coletivos em materiais reais,  se comparado às predições teóricas, deixa uma pergunta em aberto: Qual é o verdadeiro papel da desordem atômica na formação dos estados quânticos coletivos?

Nossa pesquisa apresenta uma estratégia em contribuir para responder esta pergunta.  O aluno de doutorado Cauê Kaufmann Ribeiro teve sucesso na síntese do semicondutor FeGa3 com a inclusão de uma pequena porcentagem de desordem atômica, chamada de antísitio de Fe. Este tipo de defeito atômico pode ser concebido, como uma invasão do Fe em um dos sítios de diferente simetria do Ga; ou em outras palavras, o excesso de Fe entra em lugar que não lhe corresponde. A diferença da desordem atômica aleatória, onde existem diferentes defeitos atômicos (vacâncias, intersitios, etc), em nosso material conseguimos escolher um único tipo de defeito, o antísitio de Fe. Esta distinção é muito importante, já que previa literatura reporta que o FeGa3 chamado de prístino e sintetizado por diferentes laboratórios, apresenta marcadas diferenças no transporte elétrico, muito possivelmente, originado pela influência da desordem aleatória. Para nosso caso, com ajuda de nossas facilidades instrumentais e colaboradores no laboratório LQMEC, conseguimos encontrar uma resposta reproduzível das propriedades físicas para o FeGa3 em presença de similares concentrações de antísitio de Fe. Ainda mais interessante, com a inclusão de antísitio de Fe, surgem novos estados em nosso material, além de semicondutor este também se ordena magneticamente.

Nossas descobertas despertou o interesse de colaboração do grupo de Condições extremas no ANL, liderado pelo Prof. Nenad Velisavljevic. A partir de um tempo de linha para elaborar experimentos de difração de raios-X em altas pressões até 40 GPa, e análises sofisticadas de dados feita pela aluna Aryella Faé Rabello, nossa interpretação dos resultados revela que nosso material apresenta uma transição de estrutural entorno  de 18 GPa. Além disso, nosso material FeGa3 na presença do defeito antísitio de Fe, parece ser mais duro mecanicamente se comparado com sua equivalente prístino, fato contra intuitivo quando se compara um material ordenado e desordenado na estrutura cristalina (exemplo, a comparação entre um metal e um vidro). Portanto, nossos resultados sobre as características estruturais de nosso material em presença de um tipo de defeito, o antísitio do Fe, abre uma nova rota para entender como os estados quânticos coletivos associados com a ordem semicondutora e magnética jogam uma sinergia com a robustez da estrutura cristalina de nosso material.  

Nossa pesquisa vai além do conhecimento fundamental. Entender que interações fundamentais ou mecanismos estabilizam um comportamento coletivo dos estados quânticos é primordial para a geração de materiais quânticos funcionais com uso na tecnologia quântica, uma vez que estes oferecem múltiplas propriedades físicas a menor custo energético. Nossa proposta visa produzir estes materiais quânticos em uma situação mais real com presença de desordem escolhida, oferecendo sobre esta nova configuração de desordem uma maior variedade de estados quânticos correlacionados e com propriedades estruturais mais robustas. 

Como futuros planos, o grupo do Prof. Larrea do LQMEC e colaboradores continuam elaborando novos materiais sobre a influência de um tipo de desordem peculiar, colocando assim novos desafios para elaboração de modelos teóricos mais realistas. Para isto último, o uso apropriado do machine learning pode também contribuir relevantemente nos cálculos mais acurados das energias de bandas e interações magnéticas em presença de fortes correlações eletrônicas induzidas por um tipo de desordem peculiar. Esperamos que controlando cada tipo de defeito nos permita entender o que papel desempenha a desordem estrutural na matéria quântica. Em particular, o presente estudo nos apresenta que o mundo quântico de muitos corpos pode parafrasear o seguinte ditado para o antísitio do Fe: 

“No lugar certo, algo pode brilhar mais”

Este trabalho contou com a colaboração na caracterização de propriedades físicas da Professora V. Martelli do LQMEC-IFUSP. Alem disso, devemos agradecer aos Professores D. Cornejo e M. Fantini, do IFUSP, por permitir acesso aos laboratórios de sínteses e primeiras caracterização com raios-X.  Esta pesquisa foi suportada pelos projetos FAPESP 2018/08845-3, 2019/24522-2, 2022/14202-3, 2020/01377-4 e 2018/19420-3, e CNPq 310065/2021-6.

Contato: Prof. Julio Larrea

 
 


Imagem: Montagem sobre figura original do artigo.
 

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