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Neste 31/05, nos deixou o grande professor Iuda Goldman. Algumas palavras de colegas e amigos que se manifestaram.
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"O Prof. Iuda, ou simplesmente Iuda, como a maioria de nós o tratava, deixa um imenso vazio com sua partida. Orientador profícuo, formou muitos alunos, que se espalharam por diversas instituições, como o próprio IFUSP, IFGW, ITA, o IFT-UNESP, a UFABC, o Instituto Federal de São Paulo (tanto no campus SP quanto no de Caraguatatuba) e a Universidade da Flórida Central, onde contribuem fortemente para a pesquisa em física. Iuda, exemplo de tolerância, era um agregador, que se cercava de estudantes para distribuir sua sabedoria, mesmo se não fossem seus orientandos, como foi o meu caso.
Sua mente inquieta trafegou por muitas áreas de conhecimento além da física nuclear, sua especialidade, mais especificamente a espetroscopia de raios gama. Esta especialidade fez, inclusive, com que alçasse voos sobre a origem do universo, por meio dos estudos de cronômetros de raios cósmicos, em parceria com a Universidade Berkeley. Além disso publicou trabalhos sobre modificação de materiais para eletrodos de tochas de plasma, em colaboração com o então docente do IFUSP R. Szente.
Iuda foi um scholar em todos os sentidos. Uma cultura ampla, uma profundidade abissal na sua área de pesquisa e uma disposição incansável para difundir esses conhecimentos que dominava. Prova disso foi sua disposição de continuar participando da carga didática do instituto por muitos anos após a aposentadoria (compulsória, claro).
É com muito orgulho (e uma sensação de dever mal cumprido) que ocupo a vaga de Professor Titular liberada com sua aposentadoria no início de 2003.
Iuda fará muita falta."
"O Iuda foi uma pessoa que nos deixa muita saudade. Alem das atividades acadêmico-científicas, lembro de nossas corridas pelo campus e atividades de natação nos horários de almoço. Um amigo sempre disponível. Certamente estará nas nossas lembranças mais queridas."
Antônio Martins Figueiredo Neto
Carlos Fiore
"O Iuda foi meu orientador de iniciação científica (IC) e de mestrado no IFUSP. Eu vinha da engenharia e este foi um período de grandes descobertas, no qual o Iuda teve um papel muito importante.
O projeto que ele me propôs era muito aberto e me permitiu aprender uma variedade de técnicas teóricas e computacionais. A bibliografia era desafiadora para meus conhecimentos e lembro de passar muitas horas semanais com o Iuda discutindo aspectos conceituais e específicos da física envolvida. Na época tudo me parecia natural, mas em retrospectiva, a paciência e quantidade de tempo que ele dedicava a todos era impressionante, uma característica cada vez mais rara.
Com o professor Iuda, aprendi a importância de discutir física de forma aberta, seja no quadro ou em folhas rabiscadas, conforme sua preferência, e a dedicar um tempo para explorar pensamentos laterais e ideias especulativas. O ambiente científico acolhedor e seu incentivo me ajudaram a superar minha timidez, a vergonha de errar - sem falar no seu constante incentivo para optar por projetos ousados.
Lembro também com saudades das pausas obrigatórias para café ou longos almoços quando se conversava sobre tudo. Deixam menos saudades as corridas do meio-dia pela Cidade Universitária com sol a pino no verão e com garoa no inverno.
Sentiremos muito a sua falta."
Caio Henrique Lewenkopf (Prof. Titular IF / UFF)
Gentilmente encaminhado ao IFUSP pelo Prof. Nilberto Medina
"É com imenso pesar que tomamos conhecimento do falecimento de Iuda Dawid Goldman vel Lejbman, ocorrido nesta terça-feira, 31 de maio, aos 91 anos. Iuda era professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, membro fundador da Sociedade Brasilera de Física e ex-chefe do Departamento de Física Experimental do IF-USP. Reconhecido como uma expressiva liderança científica nacional e internacional, foi pioneiro no desenvolvimento da Física Nuclear no Brasil.
O Prof. Iuda se formou em Física na então Faculdade de Filosofia Ciências e Letras e em Engenharia na Escola Politécnica, ambos da Universidade de São Paulo. Ainda enquanto estudante de graduação, participou da expedição para Chacaltaya, levando a câmara de emulsões nucleares de César Lattes. Em seguida, foi para o CNRS Orsay, no grupo de Toshika Yuasa, conhecida como a "Madame Curie do Japão" e primeira física japonesa, onde trabalhou no problema de 3-corpos em reações com prótons. Chefiou uma das equipes do CNRS. De volta ao Brasil, atuou ativamente no aperfeiçoamento do IF-USP. Foi um dos protagonistas na criação do IPEN-USP.
Sua paixão pela formação de novos cientistas sempre foi reconhecida. Uma ampla gama de docentes do IF-USP foi orientada por ele, seja em física nuclear experimental ou teórica, ou foram alunos em um dos cursos ministrados por ele. Aos que tiveram oportunidade de sua orientação, seguramente se lembrarão dos "problemas de Sommerfeld" que ele costumava passar antes de aceitar qualquer aluno em seu grupo de pesquisa. Sempre insistia com seus alunos para "aprenderem a pensar e ter ideias criativas" ou a terem uma "formação sólida em Mecânica Quântica, Relatividade, Eletromagnetismo e Mecânica Clássica" antes de aprenderem tópicos mais avançados.
Nos anos 70 recebeu convite do Prof. Vogt para dirigir o TRIUMF. Dada a então situação crítica do Instituto de Física na época, preferiu continuar como professor na USP. A partir dos anos 80 até o final, estabeleceu uma profunda relação acadêmica e de amizade com o Prof. Eric Norman, na Universidade da Califórnia em Berkeley, onde foi professor visitante por anos. Em Berkeley, ele realizou diversas pesquisas relevantes das quais muito se orgulhava, como a relação do Ti-44 com a supernova SN1987A, que valeu o prêmio destaque do ano na PLOS-ONE. Trabalhou em medidas sobre strangelets e em diversas análises de estrutura nuclear, algumas, referências até hoje. Frequentemente enviava doutorandos para estagiar lá, de forma a contribuir na formação de cientistas de alto nível.
Não podemos também deixar de destacar sua atuação política. Eterno comunista, foi sempre contrário a toda forma de desigualdade e opressão. Atuou ativamente contra a ditadura militar, sempre ajudando todos os perseguidos pela ditadura. Participou de vários conselhos e congregações na USP.
Sempre muito contente da rara oportunidade que teve, com conversas frequentes com Giuseppe Occhialini, Gleb Wataghin, Mario Schenberg, Cesar Lattes, Leite Lopes, Damy e Jayme Tiomno e de ter estudado Mecânica Quântica com David Bohm, fez parte de uma rara geração do IF, junto com Ernest Hamburguer e Moyses Nussenzveig, estudando com ambos no liceu e na graduação.
Para concluir, foi sempre muito orgulhoso de seus alunos, muitos dos quais docentes nas melhores universidades nacionais e internacionais."
Vou abaixo deixar dois vídeos curtos do professor Iuda Goldman para quem quiser conhecê-lo melhor:
Dr. Pedro V. Guillaumon (Laboratori Nazionali del Gran Sasso)
Gentilmente enviado ao IFUSP pelo Prof. Paulo Pascholati
Algumas lembranças da convivência com o professor Iuda
"Muitas das características do professor Iuda estão sendo lembradas, com saudades, pelas várias pessoas que tiveram a sorte de conviver com ele. Vou, aqui, lembrar de poucos fatos que ilustram algumas de suas características que, com certeza, me influenciaram.
Durante algum tempo, tive o prazer de conviver com o Iuda fora do ambiente acadêmico, nas muitas caronas que ele me dava. As conversas eram ótimas, pela sua capacidade de analisar e entender a realidade de uma forma objetiva e prática, tanto sobre física quanto sobre história, por exemplo, mais especificamente a do século XX, com fatos relacionados ao desenrolar de sua vida. Um exemplo: ele foi a primeira pessoa que conheci que sabia quem fora contra os créditos de guerra aprovados pelo parlamento da Alemanha em 1914, um fato importante pois, sem esses créditos, não teria havido a guerra.
Iuda fazia questão de passar na casa da Amélia e do Ernst Hamburger no período em que eles estiveram presos. A intenção era acompanhar o andamento das coisas, mostrar solidariedade, ajudar quando e se necessário e deixar claro que eles, embora presos, não estavam isolados. O isolamento ou a impressão de isolamento podiam ter consequências muito ruins durante a ditadura. Como eventual caronista, participei de algumas dessas visitas.
A última vez que conversei com ele foi em meados de abril, quando me ligou, pela manhã, para manifestar sua opinião sobre um artigo meu publicado na imprensa naquele mesmo dia. Isso mostra como ele permaneceu lúcido e atento durante a vida toda.
Iuda fará muita falta."
Ciência brasileira perde um grande lutador - Iuda Goldman
"Fui orientado pelo Iuda na iniciação científica e no mestrado. Iuda foi um ser humano excepcional, uma alma iluminada, além de excelente orientador e professor. Corretíssimo em todas as suas ações, mente muito aberta para novas propostas, e sempre desafiava a gente quando estávamos propondo novas estratégias e ideias de análises de dados. Iuda via a física de forma ampla e aberta, e sempre estimulava a gente a explorar ideias fora da caixinha, especulando sempre. E tinha especial atenção pela formação de novos pesquisadores. No ensino, sempre foi um professor extremamente dedicado, mesmo após sua aposentadoria compulsória, e adorava estar em sala de aula.
Agregava muito as pessoas, e naquela época éramos um grupo muito unido: Otaviano Helene, Vito Vanin, Marina Nielsen, Paulo Pascolati, e muitos outros. Iuda fazia questão que todos colaborassem com todos, pois via a Ciência como uma atividade colaborativa. Sempre deixava claro sua posição política à esquerda, na construção de um mundo mais inclusivo, com menores desigualdades sociais, mas sem radicalismos.
Mundo ficou menos iluminado com sua perda."
Paulo Artaxo
"Conheci o Prof. Iuda na disciplina de Física I em 1995, ano em que fui convidado para iniciar um projeto de iniciação científica (IC), sob sua orientação, no Laboratório do Acelerador Linear do Instituto de Física da USP. Iuda foi meu orientador de IC e mestrado, e trabalhamos juntos com espectroscopia gama, calculando seções de choque de reações nucleares.
O Prof. Iuda, sempre muito gentil e disponível para longas conversas, tinha uma maneira muito particular de orientar os estudantes. No meu caso, nunca houve um projeto engessado, com etapas bem definidas e um fluxograma a ser seguido. Ao me sentar na cadeira ao lado de sua mesa absurdamente bagunçada, discutíamos física nuclear, música, política e assuntos do cotidiano. No meio da conversa, Iuda pegava uma folha de sulfite e especulava sobre alguns resultados das medições e, de uma maneira instigadora - mas muito carinhosa -, deixava o estudante refletir sobre quais seriam as próximas etapas do estudo. Essa rotina, quase diária, se repetiu até o final do meu mestrado.
O Prof. Iuda esteve presente nos melhores anos da minha vida. A maneira sui generis como me orientou tem grande influência na forma como enxergo o mundo nos dias de hoje. Mais do que um mestre, o querido professor Iuda foi um grande amigo, um porto seguro para mim.
Professor Iuda, o senhor fará muita falta."
