O que controla o congelamento em nuvens da Amazônia?

Estudo de pesquisador do Instituto de Física revela descobertas inéditas sobre o congelamento em nuvens da Amazônia

Por: Comunicação IFUSP.


 

"Nessa colaboração participaram pesquisadores com formações bem diferentes. Foram intensas discussões até chegarmos a uma interpretação fisicamente consistente sobre o comportamento da temperatura de glaciação de nuvens. Para mim foi especialmente gratificante descobrir condições em que a glaciação acontece a temperaturas mais altas, algo inesperado e que ainda não havia sido descrito na literatura científica." - Comenta o Professor Alexandre Correia, pesquisador do Instituto de Física.

 
As nuvens na Amazônia desempenham um papel muito importante para o clima do planeta e para o ciclo da água. Nuvens convectivas são capazes de se desenvolver até altitudes acima de 10 km, tão elevadas que seu topo é quase sempre constituído por gotículas totalmente congeladas. O congelamento, ou glaciação dessas gotículas é um fenômeno complexo, que depende de muitas variáveis. Por exemplo, a presença de partículas microscópicas sólidas ou líquidas (aerossóis) influencia o tamanho médio de gotas de nuvens e seu congelamento. Conhecer melhor como esse processo ocorre ajuda a entender a física de nuvens, e possivelmente melhorar projeções climáticas futuras.
 
Gotas se formam na "base" das nuvens pela condensação de vapor de água sobre partículas de aerossol. À medida que essas gotas são carregadas para cima por correntes de vento ascendentes, sua temperatura decresce até que eventualmente elas congelam. No entanto, isso não acontece imediatamente quando se atinge a temperatura de 0 °C. Gotas de nuvens podem se congelar a temperaturas apenas alguns graus abaixo de zero, ou então permanecer em estado super-resfriado e se congelar em temperaturas bem mais baixas, até o limite de -38 °C.
 
No artigo "Preconditioning, aerosols, and radiation control the temperature of glaciation in Amazonian clouds" Correia e co-autores [1] mostram que a temperatura de glaciação média em nuvens convectivas na Amazônia, Tg, depende da quantidade de aerossol presente na atmosfera, mas também de quão úmida a atmosfera se encontra como um todo (Fig. 1). Tg pode estar próximo de  -10 °C para situações de atmosfera muito limpa (isto é, com pouco aerossol), e decrescer até -18 °C em condições com maior quantidade de aerossol na atmosfera. Isso acontece porque  num ambiente natural não poluído, quanto mais aerossol em geral menores são as gotículas de nuvem que se formam, e mais elas demoram para se congelar. A fumaça de queimadas, que contém grande quantidade de partículas de aerossol, altera as condições de congelamento para as nuvens na Amazônia. Quando há muita poluição de queimadas, Tg pode chegar próximo do limite -38 °C se a atmosfera estiver umidificada (Fig. 2). Se a atmosfera está com pouca umidade e com muita poluição, a formação de nuvens é dificultada devido em parte ao sombreamento que o aerossol causa sobre a superfície, efeito que contraria o movimento de convecção de massas de ar. As nuvens que conseguem se formar nessas condições não se desenvolvem muito verticalmente, e Tg permanece em níveis como -15 °C a -16 °C em média. Em escala microscópica, o fenômeno que pode estar acontecendo nesse caso é a competição por moléculas de vapor de água, entre partículas de gelo e gotículas líquidas, que leva ao congelamento à temperaturas relativamente mais quentes.
 

A conclusão é de que a temperatura de congelamento em nuvens convectivas na Amazônia é controlada por associações entre 3 atores principais: a umidificação da atmosfera, partículas de aerossol, e a radiação solar. Em situações limpas, fora da época de queimadas na Amazônia, a ação combinada da umidificação da atmosfera e a presença de aerossóis faz com que Tg seja reduzido quanto mais aerossol e umidade estiverem presentes. Em condições de poluição intensa, o efeito depende da umidade na atmosfera: para uma atmosfera úmida, Tg é reduzido quanto mais aerossol estiver presente. Se a atmosfera estiver relativamente seca, Tg é aumentado como consequência do sombreamento da superfície pela interação entre radiação solar e partículas de aerossol.

Acesse AQUI o artigo completo em Nature | Communications Earth & Environment 

► Contato com Prof. Alexandre Correia - acorreia@if.usp.br

 

 


 

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