Nobel de Física 2021 | Previsões sobre o comportamento de sistemas complexos

Pesquisadores do IFUSP que trabalham em áreas afins às laureadas com o Prêmio Nobel deste ano analisam os trabalhos contemplados. Confira o comentário do professor e pesquisador Henrique Barbosa, do Laboratório de Física Atmosférica do Instituto de Física USP.

Por: Henrique Barbosa, para Boletim Informativo IFUSP. 



Cientista japonês, alemão e italiano dividem Nobel de Física 2021 -  Mundo-NipoO prêmio Nobel de Física de 2021 foi para a área que chamamos de "Sistemas Complexos". Quando olhamos para a natureza, encontramos uma variedade de sistemas com diferentes graus de complexidade. O prêmio deste ano reconheceu nestes três cientistas a capacidade de fazer previsões sobre o comportamento destes sistemas complexos. Na minha visão, o prêmio também reconheceu a contribuição científica de uma área que é de grande importância para a humanidade - o tempo, o clima e as mudanças climáticas - mas que raramente estão sob os holofotes dos físicos.

De um lado, metade do prêmio foi para Giorgio Parisi, por seus trabalhos em Mecânica Estatística. É um prêmio bastante merecido - ele mostrou como a interação entre a desordem e as flutuações microscópicas consegue explicar as propriedades macroscópicas de sistemas físicos. Ele trabalhou com o que chamamos de "vidros de spin", que não é um vidro, mas sistemas de átomos que interagem através do acoplamento dos momentos magnéticos e que, neste caso, têm uma distribuição aleatória, como os átomos em um vidro. O trabalho mostrou como se consegue explicar essas propriedades macroscópicas a partir do mundo microscópico.

A outra metade da premiação foi para o estudo do clima na Terra. O clima do sistema terrestre é complexo da escala de milímetros à escala do planeta inteiro. Premiaram dois trabalhos e cientistas que fizeram modelos fundamentais. Um deles é o Syukuro Manabe, climatologista, que olha para o que chamamos, em física, de propriedades emergentes do sistema complexo. Ele parte do que está acontecendo com o sistema complexo terrestre para entender o funcionamento dele e poder fazer previsões sobre seu comportamento. É a visão oposta à do Giorgio Parisi, que parte do mundo microscópico. O Manabe, então, constrói o primeiro modelo para fazer previsões de Mudanças Climáticas, e faz previsões do aumento da temperatura. Esse desenvolvimento dos modelos que ele começou é o que semeou praticamente todos os modelos e os grupos de modelagem que temos hoje trabalhando nessa área no mundo. Tudo começou lá atrás, com os trabalhos dele na década de 60, que permitem termos hoje previsões muito acuradas de mudanças climáticas e o que vai acontecer com o planeta devido ao aumento do CO2 na atmosfera.

Klaus Hasselmann, o outro cientista da área de clima que dividiu o prêmio com o Manabe, trabalha parecido com o Giorgio Parisi: indo da escala micro para a macro. Ele trabalha com esse mundo microscópico, mas no sistema climático, tentando entender os processos físicos e quais são as consequências para as propriedades do clima, em termos de mudanças climáticas. Neste ponto, existe algo que as pessoas nem sempre têm clareza, que é a diferença entre tempo e clima. O tempo é o que a gente experimenta no dia-a-dia: podemos ter muito sol num local, uma tempestade em outro. E o sistema tem um comportamento médio, esse comportamento médio é o que chamamos de clima. Há uma grande dificuldade em fazer boas previsões de clima e mudança climática. Acreditava-se que a razão era apenas devido à falta de recursos computacionais - ou seja, com mais poder computacional, poderia se fazer simulações mais realistas. Só que isso não resolve totalmente. O que entendemos hoje, em parte pelos trabalhos do Hasselmann, é que a falha dos modelos ao resolverem as escalas muito pequenas no sistema climático - as escalas que vem, justamente, da parte do "tempo" - acaba afetando como conseguem prever o clima.

Foram essas duas vertentes de sistemas complexos na natureza que foram agraciadas  com o Nobel de Física este ano. Na minha visão, o prêmio manda uma mensagem muito positiva para a comunidade científica, principalmente para os mais novos, sobre a importância dessa física da complexidade que aparece em diferentes áreas de atuação dos físicos, mas que também recebe importantes contribuições de outros cientistas, evidenciando que há uma conexão entre áreas que pareciam ser distintas.


Ilustração: Niklas Elmhed / nobelprize.org

 

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